quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Pior dos Medos

Era gostoso o barulho da água na janela. Gostava de entrar escondido no carro do seu pai enquanto ele o lavava, dando grandes sorrisos quando pega em flagrante e saía correndo com uma gargalhada estridente molhando os lábios, escorrendo a felicidade e espalhando alegria como espuma por onde tocava. A infância é algo á se memorar, e agora vendo sua prima mais nova dançar um balé invisível com um parceiro imaginário sentia vontade de dançar com essa mesma espontaneidade. Já não podia mais. Namorava. Um rapaz promissor para as realidades daquela cidade minúscula e sem perspectivas de futuro, sonhavam alto, iriam se casar em um lugar remoto, uma cerimônia particular, com poucos convidados. Viam o mundo de maneira diferente, distante, louca... Sairia dali assim que possível. Ele, seu namorado, já morava fora há algum tempo e isso a deixava sem ter vontade de ficar, parecia que ele estava vivendo o sonho deles dois, sozinho. Dói, saudade. E é por isso que iria sair, aos poucos sentia morrer a alma nesta cidade “fimdemundo” em que se enfiara por puro descaso do Destino. Sentia a herança do seu nome a impulsionar a fugir daquela realidade assustadora e imutável, queria pegar seu Páris e fugir, nem que Esparta e Tróia se explodissem, não desistiria dessa felicidade. Aliás, se chamava Helena. Aos poucos observava o mundo, e tão gradativamente quanto, esse a fascinava. Seria hoje, a fuga, a janela lhe pareceu convidativa. Corda de lençóis, ainda era dia, mas que diferença faz? Dia ou noite, qualquer que seja a hora, é uma busca de liberdade. Sentiu as pernas falharem e o coração fraquejar. Sentiu a cabeça rodar. Gosto na boca era ruim. Ouvia sua avó lendo pequeno príncipe para ela dormir. Sentia-se sozinha, queria achar um cometa por ali. O espaço em volta era negro, mas era dia ainda. Podia pegar o manto negro... Era seda. Uma seda negra. Queria saber agora o que tinha lá, por detrás do manto negro. Tateou o manto, uma criatura, sem odor, sem rosto e sem piedade, puxou um punhal prateado banhado de lágrimas e de más decisões. Sentia em seu sorriso o mais puro medo, medo do futuro e de tudo que é incerto. O punhal entrou sem dificuldade, sem resistência, entre as costelas. A Saudade escorria escarlate, não era qualquer saudade, era saudade do futuro. Sentiu saudade do futuro... Olhou dentro dos olhos do assassino de seu futuro e sentiu sabor de sangue na boca, sentiu faltar o ar, sentiu-se desamparada estava imersa em Medo... Medo do Futuro.

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